27 de outubro de 2024

30 anos depois, VIAGEM A UM TEMPO DE ANTENA DO CAVAQUISMO

Os cavalos a correr...
no Avante! de 30.4.1994

Beneficiando obviamente de facilidades concedidas pelo PSD no âmbito do que se costuma chamar a «propaganda da propaganda», logo na manhã de segunda-feira o «JN» podia anunciar que  «o puro sangue lusitano, generoso e temperamental»  seria  «o elemento audiovisual dominante em todo o tempo de antena do PSD »  que a RTP transmitiria na noite desse dia, numa escolha destinada a exprimir a «impetuosidade triunfante»  da mensagem televisiva do PSD.

De facto, assim foi. Com o «Bolero» de Ravel sempre em fundo, lá tivémos os cavalos a correr ao serviço da esfalfante missão de fazer os portugueses aprender quanto do prestigio mundial de Portugal, do progresso e modernização do país e da vida boa e feliz do seu povo se deve ao PSD e a Cavaco Silva.

Sejamos compreensivos com o PSD: quem não tem cão, caça com gato.

Não há agora uma selecção nacional de juniores campeã mundial cujas imagens possam ser instrumentalizadas pela propaganda do PSD.E o « novo homem português », que Cavaco Silva em tempos anunciou pretender criar, ainda não começou a sair da linha de montagem e, por isso, também não pode ser exibido em tempos de antena de televisão. 

Sem os juniores campeões e sem exemplares decentes e credíveis do «novo»  português, compreende-se, a muitos títulos, que o recurso aos cavalos lusitanos - impetuosos mas domados, fortes mas irracionais, correndo em manada na direcção imposta pelo susto causado pelo helicóptero por conta das filmagens do PSD - tenha agradado aos responsaveis do PSD.

O resto do tempo de antena não tinha nem história nem novidade. Porque, tirando os miserabilistas e catastrofistas do costume, todos sabemos que nós, portuguesinhos valentes comandados pelo Prof. Cavaco,  « estamos a vencer a crise internacional que nos bateu à porta »  e « aproximamo-nos a passos largos dos países mais desenvolvidos da Europa » , que Portugal é o máximo para estrangeiros. Porque, tirando os pessimistas e derrotistas do costume, todos sabemos  que « Portugal deu a volta e está a vencer » e que , tal como aquele inesquecível casal « descoberto» pelo PSD, tivémos mais dinheiro este ano e até já não precisámos dessas misturas de apartamentos de férias alugados a meias.

Mas então - perguntará algum leitor mais desejoso de equilibrio e imparcialidade - não se salvou nada no tempo de antena do PSD ?

Claro que sim. Nem mais nem menos que os cavalos lusitanos - bonitos e simpáticos animais - e o «Bolero» de Ravel.

Naquela peça de mistificação e ilusionismo, eram os únicos inocentes. Ninguém lhes pediu opinião e, por sinal, até já existiam antes de Cavaco Silva ter empreendido esse pesadelo que cinicamente baptizou de  «democracia de sucesso».

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