Vítor Dias
Tendo no passado mês de Outubro decorrido 50 anos sobre as «eleições» de 1969*, é justo evocar essa efeméride como a de uma grande jornada da luta antifascista e democrática que se revestiu de características muito positivas e singulares e que viria a marcar poderosamente todo o processo político nacional até ao derrubamento da ditadura, em 25 de Abril de 1974.
Essa vasta e dinâmica intervenção democrática no plano da luta legal, assegurada pelas Comissões Democráticas Eleitorais (CDE),–constituiu desde logo uma extraordinária e combativa resposta à «manobra de demagogia liberalizante» urdida por Marcello Caetano (assim lhe chamou acertadamente o PCP, enquanto outros sectores democráticos – que viriam a quebrar a unidade concorrendo como CEUD – aí viram erradamente uma «primavera marcelista») e marcou o início do Outono do regime fascista, abrindo ao mesmo tempo caminho para quase cinco anos de ascenso da luta popular pela liberdade, pela democracia e pelo fim da guerra colonial.
É inteiramente justo reconhecer a valiosa e leal contribuição que, para a campanha das CDE, para além do PCP, deram outros sectores e personalidades antifascistas, e isso é tanto mais justo quanto é certo que, sem ela e dada a concorrência eleitoralmente separada do grupo Mário Soares/ASP/CEUD, se poderia ter verificado um perigoso isolamento político dos comunistas.
Mas, ao mesmo tempo, longe de qualquer proselitismo sectário e, antes, em estrito respeito pela verdade histórica, bem se pode dizer que, tanto pelas suas concepções de funcionamento democrático como pelas suas orientações programáticas, a intervenção das CDE representou, porventura pela primeira vez, uma clara hegemonia (no sentido rigoroso do termo e não no corrente sentido pejorativo) das justas concepções e orientações do PCP na acção democrática no terreno legal.
Marcada pela audácia, entusiasmo, firmeza e espírito criador, a intervenção eleitoral das CDE, apesar do vendaval de intimidações, proibições e acções repressivas que defrontou, traduziu-se numa grande campanha de massas contra a exploração, os baixos salários, a pobreza, a carestia de vida, a total ausência de liberdades políticas e sindicais, o atoleiro da criminosa guerra colonial.
E, ponto muito relevante, graças designadamente à grande participação juvenil que suscitou, permitiu a formação de centenas e centenas de novos quadros para a luta antifascista, que viriam a dar uma relevante contribuição para o multifacetado combate à ditadura nos anos seguintes e na própria revolução de Abril.
Tempo, pois, para evocar com gratidão e respeito a determinação, coragem e energia política de todos os homens, mulheres e jovens que, nessa época áspera, perigosa e desafiante, souberam estar à altura das melhores aspirações do povo português e das mais prementes exigências da nação inteira.
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